quarta-feira, 3 de junho de 2020

Uma ode ao netcafe... e ao frio

Sempre que tá frio eu lembro do Japão.

Não me leve a mal, a maioria das lembranças que tenho de frio no Japão são de sofrência: a primeira noite que dormi lá no apartamento, poucas horas depois de chegar do Brasil, eu tava soltando fumaça da boca DENTRO do apartamento, foram alguns dias até a gente finalmente comprar um aquecedor elétrico, até lá foram noites MUITO frias, a minha sorte é que eu trampava de noite em Dezembro então pegava um horário melhor pra dormir (em relação ao calor).

No trampo era pior ainda: a gente usava uns casacos de exploração polar pra aguentar as temperaturas negativas de fora da fábrica, mesmo assim era frio pra caralho, ainda não esqueço o dia que peguei -8ºC trampando, eu juro que nunca antes na minha vida senti aquele frio. Depois de ser transferido pro turno da manhã ficou menos pior, mas ainda eram temperaturas absurdas, trabalhar a 3ºC era sorte.

Indo pra Tokyo o frio também não perdoava, peguei várias chuvas e tirando o fato das fotos ficarem mais bonitas, chuva é uma bosta de qualquer jeito, eu quase escorreguei na frente da estação Shinjuku numa poça congelada. Não foram poucos os dias que eu queria pular num onsen.

Enfim, eu tenho uma lembrança boa tão randômica do frio no Japão que precisei explicar todo o prefácio antes de como passar frio no Japão na real foi uma merda. Mas eu tenho essa memória tão específica que sempre aparece nos meus sonhos: os corredores do netcafe onde eu dormia quando ia pra Tokyo.

O Customa Cafe de Yoyogi foi minha casa por umas 5 noites, você chegava lá, pagava 2000JPY por 10h de uso da sua cabine privada e tinha direito a um banho, toalha e uma bebida, o valor é absurdamente bom pra localização, ainda mais com a cabine dessa rede em particular ser totalmente fechada e climatizada.

Minha cabine na primeira ida solo pra Tokyo.
Teve vez que o PC não funfava, o painel do climatizador tava tiltado (e tive que dormir SEM CAMISA) e outras coisas que aconteceram porque o baka aqui não manjava um caralho de japonês, mas pelo preço, pela privacidade e localização não tinha muito o que reclamar.

Minha lembrança de frio é andar pelos corredores do net café (que não eram climatizados) e passar um frio do caralho usando os chinelos-muito-pequenos-pros-meus-pés quando queria ir pro banheiro, tomar banho ou comprar alguma bebida na vending machine do andar.

Os netcafés são interessantes porque não são direcionados pra turistas, maioria dos clientes são japoneses que perdem o último trem ou que MORAM lá por ser o único lugar que podem pagar pra viver em Tokyo, eu lembro de ter visto que os planos mensais lá eram uma pechincha tendo em vista a localização e o que tava incluso, tipo uns 35~40kJPY por mês.

E por ter só japonês lá, o netcafé tinha vibe de hotel (pelos corredores de portas juntas iguais) mas também tinha meio vibe de apartamento, de manhãzinha você via uma galera saindo pra trabalhar, além das máquinas de lavar sempre ocupadas. A vibe era bem diferente do hostel que fiquei em Shimokita.

Meu pé com meia com os chinelos que os caras deixavam pra cada um na entradinha do cubículo.
Tomar banho no netcafé era engraçado porque você tinha que avisar a recepção e eles te falavam o número do chuveiro e o andar e você tinha direito a uns 10 minutos de água. O acionamento da água era tipo uma torneira de banheiro público, uma acionada durava uns 20 segundos e você precisava ficar com a mão na torneira pra água cair sem parar. O shampoo e sabonete líquido estavam sempre no box (assim como no hostel que fui) e eram muito bons. A volta do banho era sempre dolorosa porque eu voltava quente ainda mas até chegar no meu quarto meus pés já estavam congelando.

Interfone, saquinhos de lixo e lenços de papel estrategicamente posicionados.
 Na moral que o dia que dormi no netcafé pela primeira vez foi também a primeira vez que dormi sozinho numa viagem na minha vida, eu tava às 23h recém-saído de um show bem foda no meio de Tokyo e não fazia a menor ideia de onde cair morto, vi o letreiro do Customa de longe e lembrei de uma lista de netcafés que tinha visto faz tempo e decidi apostar minhas fichas lá, e deu certo. Se desse errado o plano era acordar minha prima em Tsukuba e pegar um trem de mais de 1h pra lá, com altas chances de não conseguir chegar a tempo do último trem.

Eu não fiquei com nenhuma lembrança física do netcafé infelizmente, joguei fora a notinha fiscal (devia ter guardado todas elas), não comprei nada do amenity kit que eles ofereciam porque eu já tava com tudo na mochila: creme de mão, pasta de dente,etc. e também não tirei muitas fotos porque não via muito glamour em dormir lá, mas rapaz, que saudade de dormir no estofado duro dos cubículos do Customa Café de Yoyogi.

A notinha com o número do cubículo, o cartão vale-uma-bebida e a pranchetinha que era o chaveiro da chave do quarto.
 Ainda sonho às vezes que estou andando usando o chinelo do netcafé, com metade do calcanhar pra fora, pelos corredores que pareciam labirintos no Customa de Yoyogi em busca de um chá de limão com mel da vending machine, já que ela estava no mesmo andar eu deixava a porta destrancada (eu tava no Japão afinal) e com meu fiel porta-moedas comprado na Daiso numa mão e meu celular na outra, eu ia passar frio por uns minutos pra ser recompensado por um delicioso chazinho quente.

E é isso aí, se quiserem ver mais sobre o local, procurem "カスタマカフェ" , toda a decoração e os cubículos são no mesmo estilo em todas as unidades. Eu achei interessante que em algumas unidades agora está incluso um buffet à vontade de curry, arroz e acompanhamentos no valor da estadia, a comida parece ser bem basicona mas porra, teria me poupado muita grana se tivesse isso quando eu estava lá.

Enfim, me desculpem esse post tardio sobre o Japão, eu sei que vocês estão de saco cheio e eu fiquei só três meses lá, mas foda-se o blog é meu e esse friozinho me deu uma saudade indescritível do Customa Café de Yoyogi, minha então segunda casa no Japão.

valeu, falou té mais!

EDIT: Adicionei fotos novas.

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